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Diálogo

Foto do escritor: Ascom/CogepeAscom/Cogepe

Em algum lugar, no outro plano existencial, Oswaldo Cruz, Carlos Chagas e Sérgio Arouca conversam sobre o momento atual do Brasil:

Arouca: o que está acontecendo com as pessoas no Brasil? Quando o deixei, em 2003, não existia essa conversa de negacionismo científico tão evidente e muito menos essa coisa de rede social, whatsapp. A ciência era acreditada e eu reunia os colegas da Fiocruz em frente ao Castelo para conversarmos sobre o futuro do SUS.

Oswaldo: eu já vi esse filme antes, caro Arouca. Lá no distante ano de 1904. A massa insuflada por políticos saiu às ruas para desacreditar a ciência e os cientistas. A Revolta da Vacina foi um momento muito difícil, de grande tensão, mas ao final a população percebeu que tínhamos razão e conseguimos avançar com nossas medidas de proteção à saúde e garantir a vacinação.

Chagas: eu lembro da tua luta, meu amigo Oswaldo. E te digo Arouca: que inveja do SUS que vocês criaram a partir do Movimento Sanitário. Nós, nas primeiras décadas do século XX, também logramos avanços com nosso sanitarismo, mas jamais imaginaríamos algo tão imponente e universal como o SUS.

Arouca: a luta foi dura, Chagas. Dura, mas uma boa luta. Hoje, o SUS é uma realidade e está provando mais uma vez a sua importância como a principal conquista social do Brasil. Temos o maior sistema de vacinação gratuita do mundo.

Oswaldo: eu fico muito feliz com esses avanços, mas ainda há muito o que fazer. Vejam, por exemplo, essa tal Covid-19? Eu enfrentei com sucesso a peste, a febre amarela, a varíola, mas nunca vi nada igual a esse vírus.

Chagas: Eu vi, Oswaldo. Eu sou o único entre nós que enfrentou uma pandemia semelhante a esta. Foi em 1918, a temida Gripe Espanhola. Assim como hoje, na época foi bastante difícil orientar a população e combater o mal que se espalhou pelo país. Havia muita desinformação e mentiras, que hoje chamam de fake news. A crise foi tão séria que até Rodrigues Alves, o então presidente eleito, foi um dos que o vírus levou. Ele sequer tomou posse.

Oswaldo: por falar em presidente, Arouca, você conheceu o atual presidente do Brasil dos tempos em que eram colegas na Câmara dos Deputados? Como era o sujeito?

Arouca: eu não tive muito contato. Ele era um parlamentar de outra vertente ideológica e, pelo que lembro, com atuação bastante apagada. Assim como Rodrigues Alves, ele também contraiu a doença, a Covid-19, mas parece que se recuperou. Espalhou para todos nessas tais redes sociais que tomou cloroquina. Fez muita propaganda do remédio.

Chagas: a cloroquina que a Bayer desenvolveu? Lembro de alguma coisa sobre a descoberta. Foi em 1934, o mesmo ano em que me mudei para cá.

Arouca: então, ele usou a hidroxicloroquina, mas pelo que vi não tem a eficácia comprovada.

Oswaldo: ele é um dos nossos? Digo, é cientista?

Arouca: não, ele era militar, mas foi desligado do exército e virou político.

Chagas: e como recomenda o uso de um remédio?

Arouca: não sei explicar. Mas sabe que apesar de todo esse quadro de dificuldades sanitárias, nós temos algo que segue como motivo de orgulho de todos os brasileiros.

Chagas: o quê?

Arouca: o nosso Manguinhos.

Oswaldo: sim, sim, Arouca. Isso me enche de felicidade. Lembro das nossas dificuldades, em 1900, para criar o Instituto Soroterápico Federal. Em dizer que hoje, a instituição leva o meu nome. Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz. Olha que eu gostei muito disso.

Chagas: você merece, fio. Cruz credo se não existisse essa Fundação, que também tive a honra de ser presidente e seu sucessor. Por: Eduardo Müller

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